01 maio, 2009

Luzandira

Procurava entre os seus apetrechos, uma infinidade de coisas miúdas e sem importância e que, em alguns instantes, se tornavam vitais. Buscava a agulha de desfazer pontos. Decerto faria frio mais a noite. Iria encontrá-los, os amigos do último homem com quem andara flertando. Já haviam sido, formalmente apresentados, mas ainda não o havia levado para a cama. Era o se. Gostava de cinema e do mês de maio. Maio era março suavizado e deslizante. Mais tarde, na terceira série, lhe seria dado o sabor das tardes. E agora era o tempo de aprender. Aí começou. Porque, um pouco antes, desde a morte do cão, soube o que era ela. Algo vivo, frágil, a mercê da brutalidade que é o amor do outro. Havia necessitado até a última gota daquele copo de uísque. Não resisto e levanto uma das faixas da persiana pra ver o barulho que passa. Era ele, o vendedor de biju. Além dos carros. Sentava à frente, por ser menor que os outros, e recebeu o valor dos cantos e das paredes. Sua bondade, bem organizada e de fala baixinha que, mesmo irritada, nunca gritava. Sempre que a via sentia vontade de chorar. Tinha raiva dela. Várias aprontou. Como aquela redação pregada na parede, com as borboletas e as flores de papel e aquela letra. ( ) a letra com que sempre desejei escrever meu nome. O jardim que havia plantado para dizer primavera. Ali, pregado na parede, para todo mundo ver. Lindo! E também não pensou duas vezes antes de delatar a freqüência com que não ia, e o atrevimento e a impertinência. Mas era uma boa menina, mesmo assim, e inteligente e esperta. Sempre tinha um palpite errado pra ser dado. Apanhou e foi comparada ao que não devia ser, o irresponsável que suspeitavam estar cheirando cola. Qual seja a razão, matariam sempre as aulas. Fosse para estar só ou por não ter coragem de dizer a ela que já era tarde demais. Não se lembrava do mundo sem as drogas, sempre estiveram lá, desde que precisou respirar. Outra boa foi o sapo. Justo o sapo, o boca grande? Queria ser a borboleta, o bonito. E a recuperação? Aula durante as férias, só com os bobos na sala, os outros, que aprendiam com ela, lá fora, brincando no pátio da igreja. E é preciso dar graças por cada instante que não passou naquele pátio e sim naquelas conversas de adulto com criança, dando coisas pra dizer às cartas que receberia. Tinha fama de durona e brava e era feia pra essa beleza de atriz de novela. Disse a outra, que chegou à porta: vai escrever o discurso da posse do Tancredo. Escreveu o discurso, mas o cara morreu antes da posse, como toda esperança. E que preguiça era o sol das 14:45 que ia junto morro acima, pisando a poeira vermelha onde escorria e se remodelava. A boneca sem pescoço e com uma perna mais curta que a outra. Parecida com a personagem daquela outra história, patrocinada por essa bebida maldita que engulo ao longo de todos esses anos. E de novo o discurso:

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Cores para noites sem lua